domingo, 12 de maio de 2024

A Naturalização do Errado e a dor das Famílias Upanemenses

Escrito por um Upanemense anônimo 

Hoje cedo eu fui visitar minha amada mãe pelo dia que convencionaram como dia das mães, embora eu considere dia das mães todos os dias. Estando ali em Upanema lembrei de José e da dor que sua mãe está sentindo hoje. Não conhecia José, nem tampouco a mãe dele, soube de sua breve existência porque ele faleceu de um acidente de moto na última semana em Upanema. Esse fato nos faz refletir sobre verdades duras. José não deveria estar pilotando motocicleta, já que tinha apenas dezesseis anos de idade. Não é o primeiro que morre em Upanema nessas circunstâncias e é difícil pensarmos que será o último.

Após sair da casa de minha mãe fiz um deslocamento breve pelas ruas de Upanema e como sempre, visualizei diversos adolescentes, algumas crianças até, conduzindo motocicleta pelas ruas da cidade. A conclusão óbvia é que os pais dessas pessoas nada aprenderam com a última tragédia.

É preciso reconhecermos que o sangue de José está nas mãos de muita gente. Esse sangue está nas mãos  das autoridades constituídas que não fiscalizam, não cobram e não fazem o suficiente para amenizar o problema. Também há sangue de José nas mãos de cada pai, mãe, tio, avô, de cada parente que entrega veículo a menor de idade, pessoas sem  maturidade suficiente para condução desses veículos. O discurso é o mesmo: "Ora, o filho de fulano anda por que o meu não pode andar?"Alguns vão além e presenteiam seus filhos com motocicletas, alguns que mal atingiram doze anos de idade, pasmem.

O problema do menor ao volante não é exclusivo de Upanema, mas poucos locais a situação é tão escancarada como aqui, pois o absurdo salta aos olhos. E as razões são muitas, a maior delas é o círculo vicioso que se criou com a naturalização do errado. Quem tentou combater esse problema inevitavelmente foi taxado de politiqueiro, xingado publicamente. Quando o pai autuado é do lado do prefeito, a acusação é de que  a autoridade que o autuou é da oposição. Do contrário quando o pai não é do lado do prefeito, o que se espalha na cidade é que a autoridade é do lado do prefeito e por ordem dele está perseguindo opositores. Tudo aqui se politiza, tudo aqui se problematiza com foco errado. O fato é que os valores continuam invertidos e ninguém é capaz de reconhecer o cerne do problema, a falta de aplicação de regras básicas dentro das famílias e na sociedade em geral.  

Quando um parente entrega um veículo a um adolescente, ele está colocando essa pessoa em real risco de acidente. Também está cometendo uma infração gravíssima de trânsito e o crime capitulado no Art. 310 do Código de Trânsito Brasileiro que é "permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor a pessoa não habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir suspenso, ou, ainda, a quem, por seu estado de saúde, física ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-lo com segurança", cuja pena é detenção de seis meses a um ano ou multa. Além disso, está transmitindo uma péssima mensagem ao adolescente de que ele pode violar as determinações legais, muitas vezes gerando no adolescente a falsa impressão de que ele pode tudo.

Dito isto, é preciso que a morte de José não represente só um número numa estatística nefasta. É preciso que o lamentável fato seja sim explorado para salvar a vida de jovens em situações semelhantes. É preciso que haja uma tomada de atitude pelas autoridades e que acima de tudo, que haja uma tomada de consciência na sociedade, para que se pare de se naturalizar o errado. Por José e por tantos outros que já se foram por culpa também nossa, mas essencialmente pelos que aí estão, descumprindo as normas legais e elevando o risco de dor às famílias Upanemenses.



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